segunda-feira, 27 de julho de 2009

Dança dos Braços

Primeiro foram os braços:
Que iam se enlaçando aos poucos
E, ao som de dizeres roucos,
Tornaram-se abraços.

Depois vieram as lentas mãos,
Desbravando cada centímetro da tez,
Desafiando a própria lucidez,
Se atrevendo contra todo o coração.

Na ignorância dos mais sábios,
Fez-se o espanto inesperado
No encostar de certos lábios;

E na incoerência dos sãos,
Fez-se a frase sem sentido
No separar de duas mãos.

domingo, 5 de julho de 2009

Despedidas

Abraço. Olhos nos olhos, cintilantes olhos, e mais um abraço.
A bagagem vai, ébria de tanto peso, até a mala do carro e, num aperta daqui e afrouxa dali, entra finalmente, não obstante desajeitada.
São uns chamegos tão doces, uns sorrisos tão curiosos, uma avassaladora enxurrada de palavras que não consegue passar da garganta; são apelidinhos carinhosos, promessas para o ano que vem, brindes do próximo ano novo.
Manda um beijo pra Fulana, dá notícias pra Sicrano e não esquece de entregar o presente de aniversário de Beltrano! E mais recados. Mais notícias, mais presentes. Mais, mais, mais... Em cada vez menos tempo - pois vai chegando a hora do voo.
Abraço. Olhos nos olhos, lacrimosos olhos, e mais um abraço.
Alguém entra no carro, um outro alguém liga o carro, aciona o taxímetro e dois corações se distanciam. Outrém chora, lembra, sente saudade e olha, até o sumir no horizonte, o partir de um carro qualquer com a placa vermelha.
Assim se despedem os pais e filhos, namorados e namoradas, amigos, parentes, colegas... Assim despedem-se os que se gostam.

De onde vem o triste

Não há, na vida, tristeza:
há ausência de felicidade.
A alegria, brinde eterno do cotidiano,
Faz-se felicidade dia por dia, todos os anos.
E ela vem à conta-gotas, pincelada,
No trabalho dos poetas e assistentes sociais,
Ela vem molhada de suor, esmigalhada.

Findo o labor,
Espera-se o confronto com a felicidade:
No semblante da mulher,
No sossego,
Ou nos tenros braços de Deus.

Descobre-se, então, que existe tristeza:
É um sentimento pobre, egoísta,
De quem desistiu de esperar a felicidade.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Um Amanhã

Espero, paciente, a chegada de um dia:
Em que, banhados de melancolia,
Nós possamos mirar o céu e ver
Que a águia da alegria
Voa livre entre nós.

Tanto lixo e tantos homens
Que se assemelham a porcos,
Mortos de fome, imundos;
Tanta gente suja, torpe,
Matanto por ganância o nosso mundo...
Vai raiar, um dia há de raiar.

Um amanhã em que o tempo irá parar,
e as cores vão, enfim, desaparecer:
Para contemplarmos o espalmar
De nossas mãos.