segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Distração

Nós não precisamos de algo para nos distrair: a distração sozinha se faz na ausência do fazer.
É por isso que quando nos isolamos de tudo que nos distrai, a fim de que possamos nos concentrar, nós nos distraímos do mesmo jeito, com o nada.
Hoje cheguei uma e vinte minutos mais cedo do que deveria ter chegado onde estou, e a distração se fez.
Se fez no papel e na caneta; na chuva que vinha chegando; nos minutos que passaram até agora; nas pessoas que falam ao redor e no futuro arranha-céu que estão construindo bem ali no horizonte.
A distração sozinha se fez.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Casos

Eu beijo com as Línguas...
Namoro a poesia, caso com a prosa, chifro com a crônica e acabo desquitado (contos são só um caso à parte). Eu gosto mesmo é da palavra: procuro-a na forma do mesmo jeito que se procura o amor em uma mulher.

Desencontro das Águas

... É um mar de águas escuras, mas é bem calminho e venta tanto em sua praia que teus cabelos e teu semblante sentiriam realmente o sabor da liberdade incondicional.
Ao pôr-do-sol, a bola de fogo se apaga de pouco em pouco, e o calor vai tocando teu rosto, a luz vai te abraçando passionalmente e tu te entregas ao brilho. Faz-se o contraste com o frio que o vento traz.
A noite vem descendo, a lua vai subindo e então se vê apenas o breu.
Teus olhos enxergam nada mais que trevas, as cintilantes luzes solitárias dos barcos longínquos e as estrelas, tais como um colar de diamantes sobre um vestido negro de cetim.
Teus braços nus sentem não mais a quentura trazida pelo sol, e tu te agarras à ti mesma, em uma tentativa frustrada de amenizar a frieza que te tomou.
O vento mantêm teus cabelos revoltosos e teus olhos semi-cerrados.
Pões teus pés de volta à areia gelada e te distancias, sumindo por entre as árvores e me deixando tão sozinho... Como se não houvesse encontro algum entre as águas de nossas almas.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Férias

Garota, esqueça.
Pára com essa mania de insistir.
Me passa o açúcar,
adoça a amargura da vontade de pedir.

Liga a minha guitarra, mulher,
pr'eu te fazer um som que eu nunca mais te fiz.
E prepara um café,
que o álcool me confunde os sentidos.

Não rasgue essas fotos,
prometo que um dia elas vão fazer falta pra você.
Desculpa, querida,
eu não sou desse mundo e nem vim pra ficar.

Eu estou de férias,
e juro que não vou embora sem dar tchau.
Não quero voltar,
procuro por um jeito de fugir do final.

Relaxa e não liga.
O que todos dizem não importa mais.
Viva a sua vida,
ela não é pra sempre e é assim que se faz.

Não rasgue essas fotos,
prometo que um dia elas vão fazer falta pra você.
Desculpa, querida,
eu não sou desse mundo e nem vim pra ficar.

Por Acaso

Sim, foi feito com descaso,
mas meio que por acaso
deu certo e aconteceu.
Não, não posso me demorar.
Se você diz que espera,
o meu futuro não, não pode esperar.

Vou pegar o próximo bonde e me mandar daqui
pra outro lugar.
Eu queria te ver na estação pronta pra me buscar.
Você não disse que podia esperar?

E agora que eu tô aqui,
chega de blábláblá.
Deixa eu voltar pra sua vida,
e eu prometo que tudo vai durar.

Se você não se comove com os solos,
eu prometo que com as bases da minha guitarra
eu vou te cativar até você pedir
para ficar aqui comigo.
E nunca mais largar.

Vou pegar o próximo bonde e me mandar daqui
pra outro lugar.
Eu queria te ver na estação pronta pra me buscar.
Pronta pra se despedir de mim.

Sambinha

Eu quero ver você sambar.
E a madrugada vai esperar
teu rebolado encantar minha canção.

E quando a festa acabar
eu vou pedir pra não parar.
Deixa rolar o nosso amor ao violão.

Não me pergunte mais nada,
vista as roupas, faça a mala.
O nosso amor é maior que o céu azul.

E agora que estamos longe
me declaro mais distante.
Pois com você fico assim:
longe de mim.

Todos os seus amores

Se você pensa que estamos no fim,
meu bem, está muito enganada.
Este é só o começo
de todo o resto que está por vir.
Se não olhamos mais para trás,
nos perguntamos se falta algo mais.

O fim ainda está longe:
Senta e espera, vai demorar.
Se eu pego embalo pra cantar
esta canção, o tempo pode passar.
Mas por via das dúvidas,
desmarque todos os seus amores.
Quem está aqui sou eu,
e daqui não arredo o pé.

Eu conheço bem o processo,
o vai-e-vem, acaba-e-volta e tudo mais.
Se esse é o só primeiro,
como vamos encarar os demais?
Engole as lágrimas e vai sorrir,
porque eu não sou nenhum motivo pra chorar.
Lembre das chaves se for sair,
tenho certeza de que vais querer voltar.

O fim ainda está longe:
Senta e espera, vai demorar.
Se eu pego embalo pra cantar
esta canção, o tempo pode passar.
Mas por via das dúvidas,
desmarque todos os seus amores.
Quem está aqui sou eu,
e daqui não arredo o pé.

Vaga-lume

No mais singelo dos bichos encontrei o resumo da dúvida que mais me traz tormenta.
Antes a resposta, ou o caminho; antes uma dica ou um sinal. Fora só a pergunta.
Vindo do mato e do breu, incentivado pelo cantar das cigarras e o soprar dos ventos, antes que não haja mais tempo, o vaga-lume me perguntou: brilhas ou não?
Não faço idéia e nem quero fazer: deixa eu fingir que há certeza, já que cedo ou tarde ela há de aparecer.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Tic-tac, tic-tac, tic-tac...

A justiça não devia ser cega, devia ser "tempo".
Existe melhor alusão de imparcialidade?
Mas eu não fico feliz de esperar tanto, tanto...

terça-feira, 21 de outubro de 2008

É só parar de procurar a perfeição.

Eu quero uma paixão fulminante,
um amor para chamar de meu.
Quero um abraço,
e tatuado no braço
o nome que é teu.
Quero o armar e o desarmar;
Quero o atacar e o defender;
Quero o quebrar de vasos,
o bradar de xingamentos.
O gritar;
o chorar;
o beijar.
E, enfim,
paz.
É só parar de procurar a perfeição.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A História do Mundo

(Tocam violinos e piano ao fundo)
Ela, aos prantos.
Ele, de uísque na mão. Cowboy.
- Nós precisamos conversar.
- Vai embora.
- Eu errei, mas ainda sou seu!
- Eu não preciso disso.
- Eu juro que com ela não havia amor!
- Logo desse jeito?
- Eu vinha mandando sinais desde cedo...
- Ah, então a culpa é minha?
- Não sei...

Ele se aproxima, ela o afasta:
- Está tudo acabado.

A iluminação aumenta, um homem de barba branca e cajado de madeira põe-se um passo a frente, olha para ambos e diz:
- Corta! O começo está muito bom... Mas o final tem que ser assim?

sábado, 18 de outubro de 2008

18/10/08/21.45/Div.

Não quero mais escrever sobre amores que eu não sinto
Não sinto mais vontade de cantar coisas que não encantam
Chorar dores de um peito que não é meu.

Não quero mais perder a conta de fatores que me fazem feliz
E ainda assim sentir falta de coisas que nunca tive
Exemplificadas em livros, músicas, filmes.

Não quero seguir todo o futuro planejado
Quero sofrer acidentes
Falar coisas incoerentes
Algo que me leve a um lugar inusitado.

Nem que seja por um momento ou um segundo,
Queria apenas ter certeza,
Saber com muita clareza
O que vim fazer neste mundo.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Planos

Acordei.
Finalmente terminei a escola,
entrei então, na universidade de meus sonhos.
Cursei os caminhos tortuosos do direito,
fui a festas, namorei, estudei arduamente.
Enfim, graduei-me.
Trabalhei um pouco, pois a prática...
ela trás algo parecido com perfeição.
Ganhei, perdi, apostei no animal errado
e isso me fazia lembrar que daquela fez,
a besta era eu.
Mas também apostei no animal certo:
a fera que há em mim.
Fiz outros cursos e concursos,
andei entre 'logias' e 'sofias'.
Mas não só trabalhei a mente:
viajei, conheci, ri. Até casei.
Desta vez me fixei.
Filhos, muitos filhos!
Um Paulo, um José, quem sabe um João,
continuei trabalhando para garantir-lhes o pão.
Ensinei onde sempre quis ensinar,
para quem sempre quis ensinar.
Tive a oportunidade tornar à casa
com as costas pesadas de títulos
e o coração aliviado de modéstia.
Nem que seja a falsa modéstia.
Perto de meus oitenta anos,
aposentei os serviços oficiais
e passei a ter a escrita como ofício.
Levantei-me, banhei-me, vesti-me...
e o dia estava apenas começando.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

A Semana

De segunda a segunda eu falo,
na terça eu hablo.
De lua em lua eu trabalho,
e é de sol em sol que eu descanso
com a feliz fadiga que me é o canto.
Quase todo dia eu conto
as nem tão felizes histórias de um mais um.
Divido minhas horas em frações infinitesimais
e continua a quarta a não acabar jamais!
Na quinta, então, eu respiro:
dou meu jeito, me viro.
Porém, nesse dia, à noite eu espero
a sexta-feira, dia em que todos ficam
sem eira nem beira.
Aos sábados eu assisto o dia
passar num meio de emoção e tarefa:
um risco.
Então chega o domingo e nele eu morro,
me desespero, peço socorro!
E mesmo assim não me preocupo,
pois ainda estou no meio de março
e na segunda-feira eu renasço.

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Amazônia: como foi? Como será? Pt 3

Falo muito do lugar onde vivo
Afinal, nada mais passa pelo meu crivo!
Quem escolheu o tema de falar de terras onde não habito?
Um sábio não foi, apito.

Dizem que no além-rio há festas que cortam a noite
Reza a lenda, em Parintins, a noite não é escura:
É cheia de luzes, bonecos, bebidas... Nenhum açoite.
E as mulheres? Que tortura!

Atrações provincianas como essa existem aos montes
Mas no momento lembro apenas das menos interessantes,
O vôo das araras, o pôr-do-sol no rio...

Ah sim! E as estrelas na imensidão negra do horizonte.
Como pude esquecer? Seria como não mencionar
O belo colar de diamantes que um pai fez a filha usar.

Amazônia: como foi? Como será? Pt 2

Como foi?
[não sei
Li muito pouco e desta história eu ainda não estudei.
Como será?
[talvez
Todos sabem: da nascente à foz, quem traça o curso do rio somos nós.

Sei apenas como é.

Sei que desde muito tempo as pessoas sentam em cadeiras de balanço
E tardam a se balançar para ver o tempo passar
E sobre o tempo conversar...
Sei que desde muito tempo a cidade vem crescendo
[para baixo, para cima, para um lado e para o outro...
E mesmo assim vivemos como no interior:
Conhecendo todos,
Sabendo de todos,
Discutindo de todos a vida, a morte e o amor.
Sei que desde sempre os olhares do mundo repousam sobre esta terra
E infelizmente os que aqui vivem pouco fazem para defendê-la.
Ao contrário: desmatam, sujam, mentem e roubam.
A pátria amada? Não amam.
Minha sorte é saber que o verdadeiro amazonense está aí
A trabalhar
A sofrer
A esperar.
Pois ainda temos o amanhã
E o amanhã será melhor.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Amazônia: como foi? como será? Pt 1

Dos altos da borracha aos tempos em que hoje se vive
São mais de cem anos dos quais poucos eu realmente tive
E ainda assim posso afirmar:
Já vi o espaço quando olhei para um rio que mais parecia mar;
Já li os passos de homens que foram à lua
Mas não encontro comparação quando vejo um caboclo andando sem esforço
Na mais quente das ruas.
Já ouvi histórias de pescador, taxista, seringueiro e repentista,
Nenhuma era mais verdade
Que a história cravada a ferro e pedra no coração da cidade.
E nessa cidade há história.
História de monarquia: ou governar por mais de vinte anos ainda é democracia?
História de redenção: do homem que para ajudar o povo foi buscar educação;
História de luxo: é do desgosto um gosto a semente e o fruto de quem planta ilusão para colher mais um milhão;
História de lixo: é a lata, é a água, é o plástico e o bicho.
História de honra.
Honra de quem faz, e quem faz por merecer.
Merecer a glória de ter construído um império de cinza e cinzas rodeado de vermelhos no verde.
Um império elegante, um império e vistoso. Que só não é mais bonito e mais ainda harmonioso pela falta de caráter de alguns “homens do povo”.
O povo, eu digo: está fadado ao sorriso. Pois nas entrelinhas do pranto está o riso e a esperança.
Afinal, como diria o homem: o amanhã será melhor.

sábado, 19 de abril de 2008

Poeminha Besta

Rimas são óbvias, meu caro
Mas um poema sem rimas é raro
Assim como uma música sem cadência:
não ocorre com frequência

A métrica dos versos seria perfeita
Mas escrevo até deixa-los grandes, e torno a estrutura desfeita
Faço um e três, ou três e dois
Se é verso, converso: não interessa, pois

Chuto o balde e grito: leio em inglês!
De que interessa meu embasamento?!
Latim, mandarim ou português

Faço do leitor experimento e tento,
Linha após linha
Fazer do formal apenas mais um pensamento.

Matemágica

Não gosto de números


Se por á mais bê
Burlando esse sistema
Meu resultado for você
Não há solução real

Mas se fraciono minhas saídas
E multiplico os meios pelos extremos
Aplico um teorema e, finalmente
Acho meu ângulo suplementar

Então, se a ordem dos fatores não altera a soma
Não hesite em fazer diferente
Já que sabe o resultado do oposto pelo adjacente

Não gosto de números
Mas se eles não mentem
Então, contigo serei positivo até que algo melhor me inventem.

sábado, 12 de abril de 2008

Eu Sou a Arte

Eu sou a arte.
Eu grito. Brado palavrões sobre coisas que me irritam...
Eu grito em mim.
Em um quarto escuro, à luz tênue do monitor,
Eu grito, silenciosamente.
Eu pinto. Pincelo traços de idéias fragmentadas,
À mão, em teclas e cores pretas e brancas.
Eu esculpo... culpo.
Mesmo a mim, por não gritar, pintar e esculpir o suficiente.
Eu sou a arte, a representação do feio em expressões alinhadas de indignação e comodismo.
O meu próprio comodismo.
Sou o poeta e a obra; o quadro e o artista; a morte e o morto.
Eu sou a arte.